Quais são os desafios que a
Igreja Católica tem de enfrentar, e em particular seus bispos, neste turbulento
início de século? O papa João Paulo II respondeu a esta pergunta ao receber os
bispos da América Latina entre março de 2001 e fevereiro de 2003.
Ao final dos encontros que os
prelados mantiveram com o papa e expoentes da Cúria Romana em sua qüinqüenal
visita “ad limina apostolorum”, o pontífice entregou uma série de discursos aos
bispos separados em grupos e foi analisando com eles a situação da Igreja
católica atualmente.
As análises do bispo de Roma se referiam de
maneira particular à vida dos católicos latino-americanos --que constituem
quase a metade dos católicos do mundo.
Em uma intervenção pronunciada
ante a assembléia plenária da comissão Pontifícia para a América Latina,
celebrada de 24 a
27 de março no Vaticano, o arcebispo Leonardo Sandri, substituto para os
Assuntos Gerais da Secretaria de Estado do Vaticano, apresentou aos cardeais e
bispos presentes uma síntese dos desafios da Igreja, tal como expôs o papa. A
seguir, os doze desafios expostos pelo papa. Os textos entre aspas estão
tomados literalmente da conferência de dom Sandri.
1. Anúncio de Jesus Cristo
O
primeiro desafio é “anunciar a Jesus Cristo para alimentar a fé dos fiéis e
fazer que os ensinamentos do Evangelho amadureçam neles, transmitindo a
mensagem de Cristo em toda sua integridade e beleza, sem deixar de lado sua
exigência”. Esta missão deve ser “realizada mediante a pregação da Palavra de
Deus, a celebração dos sacramentos e o estímulo à caridade”.
Isso significa apresentar “antes de tudo a
pessoa e missão de Cristo, único mediador entre Deus e os homens”. “O anúncio
de Jesus Cristo deve ser claro e preciso, explícito e profético”.
2. Comunhão
“Só
quando é claramente perceptível uma profunda convivência e unidade dos pastores
entre si e com o sucessor de Pedro, como também dos bispos com seus sacerdotes,
se poderá dar uma resposta confiável aos desafios que provêm do atual contexto
social e cultural”, explicou dom Sandri citando intervenções do papa.
Isso implica, acrescentou, “a conservação do
depósito da fé em sua pureza e integridade e a unidade de todo o Colégio dos
bispos sob a autoridade do sucessor de Pedro”.
3. Sacerdotes
É
“particularmente urgente uma figura de pastor que não só atende aos fiéis
próximos, mas que incansavelmente vá a busca dos desorientados e afastados”.
Para isso, antes de tudo, o papa insistiu na
necessidade de que os bispos mantenham com os sacerdotes uma relação “de
proximidade”. “Uma grande desilusão, especialmente entre o clero jovem, é não
perceber a estima do bispo”.
O papa insistiu desta forma na “formação
humana, espiritual, intelectual e pastoral permanente”: “trata-se de que (os
sacerdotes) apareçam sempre dotados de uma sólida espiritualidade, imitando a
Cristo, Bom Pastor, e com uma bagagem intelectual que lhes faça cada dia mais
idôneos para transmitir a mensagem evangélica aos homens e mulheres de hoje”.
4. Pessoas consagradas
“Os pastores
da Igreja não só devem promover as vocações ao clero diocesano, mais
estreitamente vinculado à sua missão, mas também à vida consagrada, assim como
velar para que se respeite a identidade de cada instituto, fomentando assim
mesmo entre os fiéis a estima pela vida religiosa”.
Por sua parte, os religiosos devem “manter a
comunhão e o diálogo com os outros componentes do Povo de Deus, e em primeiro
lugar com os próprios bispos. Devem, também, distinguir-se por um especial
acatamento e obediência aos pastores da Igreja e às diretrizes da Sé
Apostólica”.
5. Seminários
Os seminaristas “devem ser recebidos, sentir-se
amados e ser convenientemente atendidos nos seminários e casas de formação
mediante um processo que ajude a desenvolver a vocação e podem um dia ser
servidores de Deus em benefício dos fiéis e de tantos irmãos necessitados”.
Isso exige, portanto, uma adequada “seleção dos
formadores” dos seminários. Ao mesmo tempo, “a escassez de sacerdotes não
justifica que se faça uma devida e exigente seleção dos candidatos, nem que
diminua o nível intelectual exigido”.
6. Pastoral vocacional
“A
promoção das vocações sacerdotais é tarefa de todo o povo de Deus e ninguém
deve sentir-se excluído deste compromisso”.
Para
alcançar este objetivo, o papa propõe várias estratégias. As três decisivas
são: “contar com famílias sadias, estáveis, fundadas nos verdadeiros valores”;
“servir-se de organizações de tipo paroquial, escolar ou vinculadas aos
movimentos apostólicos que sejam capazes de oferecer uma educação baseada na
fé, e que proporcionem um ambiente propício para a inserção de um estilo de
vida que mostre interesse pelos demais”; “o testemunho dos sacerdotes e das
pessoas consagradas”.
7. Leigos
“É
necessário um renovado convite aos seculares a participar nos âmbitos que lhes
são próprios, ou seja, a inspiração cristã da ordem temporal, a defesa e
promoção dos bens da família e a vida, a cultura, a economia, a política, de
modo que, como cidadãos e como filhos de Deus e membros da Igreja, assumam suas
responsabilidades nestes âmbitos segundo os critérios do Evangelho e a doutrina
da Igreja”.
“Os
bispos devem contar com o laicato, outorgando-lhe a confiança que merecem e não
recusando atribuir-lhe encargos para os que estejam capacitados”. O “florescer
de movimentos e novas comunidades eclesiais” deve ser considerado “como um
fenômeno esperançoso que merece especial atenção por parte dos bispos’’.
8. Família
O papa constata “uma crise generalizada e
radical desta instituição fundamental”. Pelo que pede enfrentar vários
desafios:
--“A
necessidade de uma sólida preparação dos que vão contrair matrimônio”.
–“Impulsionar as condições sociais, econômicas
e legais que melhor salvaguardem a unidade e a estabilidade dos lares”.
--Servir a família como “um lugar privilegiado
onde se vive e transmite a fé”.
-- “Fazer um discernimento pastoral sobre as
formas alternativas de união que hoje afetam a instituição da família,
especialmente aquelas que consideram como realidade familiar as simples uniões
de fato, desconhecendo o autêntico conceito de amor conjugal”.
--“Promover os movimentos e associações de
espiritualidade matrimonial”.
9. Missa dominical
“Não se
constrói nenhuma comunidade cristã se esta não tem sua raiz e centro na
celebração da sagrada Eucaristia”. “Entre as numerosas atividades que
desenvolve uma paróquia nenhuma é tão vital ou formativa para a comunidade como
a celebração dominical do dia do Senhor e sua Eucaristia”.
10. O mundo da cultura
(Universidades e escolas católicas)
“Em algumas ocasiões, a cultura que nos envolve
nem sequer propõe a existência de Deus, simplesmente prescinde Dele”. “Para
inserir a seiva nova do Evangelho na sociedade contemporânea a Igreja deve
servir-se também das Universidades e escolas católicas”.
Para isso, o papa considera que “é necessário
que as escolas e Universidades católicas mantenham bem definida sua própria
identidade”.
11. Situação social
A Igreja
“há de participar das análises das conquistas e expectativas da sociedade,
tratando de interpretar à luz do Evangelho os assuntos temporais e sociais para
orientar a mesma sociedade, não recusando quando seja o caso a denúncia da
injustiça e propondo princípios de caráter moral que hão de orientar também a
atuação da vida civil”.
Nesta obra a Igreja deve “favorecer o diálogo
entre as partes interessadas em caso de conflito” e também oferecer uma atenção
pastoral aos emigrantes.
Após
recordar que “amando os pobres o cristão imita as atitudes do Senhor”, o papa propõe:
--”Manter a voz profética diante do perpetuar
das situações de discriminação”.
--”Orientar a criatividade para a busca de
meios e atividades, por parte de todos e cada um na construção de seu próprio
porvir”.
--”A Igreja não pode conformar-se com a busca de um simples
bem-estar ou comodidade de vida, mas deve promover o bem integral da pessoa, o
respeito à verdadeira dignidade de cada ser humano, o qual implica o respeito
aos direitos humanos fundamentais e do sentido de responsabilidade, solidariedade
e cooperação para construir um mundo melhor para todos”. Nota da Redação: As
intervenções do papa em sua língua original (castelhano e português) podem ser
consultadas em “Discursos do Santo Padre João Paulo II aos bispos de América
Latina em visita ad \"Limina Apostolorum Petri et Pauli\", 2001-2003 ”, livro editado pela comissão
Pontifícia para América Latina (pcal@latinamer.va). ( Fonte: ZENIT)
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